segunda-feira, 14 de setembro de 2009

TANQUE PÚBLICO


1 comentário:

  1. ‘Vi uma noiva
    entrar num automóvel.’
    Seu esguio corpo
    molemente matando-me
    a crónica depressão.
    -
    Sant’António, meu santinho,
    sábio santo dos doutores,
    ensina-me sã doutrina,
    aceita meus louvores.
    Sant’António português,
    que acodes nas aflições;
    ama o meu coraçãozinho,
    sara-o com orações.
    Vi o Menino brincar
    nos braços de Sant’António;
    taumaturgo popular,
    mata em mim o ruim demónio.
    António dos meus amores,
    que eu ame minha mulher;
    dou-te guirnaldas de flores,
    e seja o que Deus quiser.
    -
    Que choras, amiga,
    à fonte fria?
    Amores hei.
    Alba lieiro.
    Que pranteias,
    amiga,
    no jorrar da nascente?
    De amores só.
    Alba vai levaando.
    Amores empeçados
    sem tento nem fim
    choro por mim.
    Alba asinha.
    -
    O poeta das olheiras chorosas:
    ‘Só, incessante, um som de flauta chora.’
    Antiga tristura, que lágrimas devoras,
    o sol há vasto tempo erguido,
    porque não foste embora?
    ‘E, no longe, os barcos das flores?’
    Pétalas leves sobr’alma derramadas.
    Será que morro exausto,
    cumprida e ida a faina?
    Ou é que o pranto sara,
    e o pavoroso tremor extingue?
    Quem sonha alto agora?
    Astros alcança?
    Por quais silêncios mora?
    -
    ‘Aquela triste e leda madrugada,
    enquanto houver no mundo saudade…’
    Quero que quede sempre demorada
    a meus olhos abertos porque nada.
    Campos verdes, na clara luz banhados,
    arvoredos, automóveis, idos passantes pasmados,
    roucos sons aos dos pássaros acordados mistos.
    E rosas, e aromas, e tons, e amores de meus amores.
    Se o dia rompe à mesma hora que a flor,
    e a neve é véu de bodas sobrevoando,
    madrugada rompante, dos meus dias,
    inclines minha alma a jubiloso fervor.
    Acenam asas voos p’lo monte.
    -
    ‘Se não me lembrar de ti,
    Jerusalém das alegrias!...’
    Leveza, alados voos,
    ternura, enlevo, olhar,
    o dentro das tuas portas,
    revolto resplendor.
    Íntimo anelo, ascensão,
    desde já eternidade.
    -
    Só sonhada ventura
    me conforte
    da vivida desventura;
    sonhe enfim,
    e fundo frua
    a doçura
    que o dia me negou.
    Moças mil,
    flores queridas,
    indícios foram meus
    d’idílios mil,
    p’los tempos que aqui tive,
    dos quais não vi senão enganos.
    Seja todo teu,
    donzela das donzelas.
    -
    Sedia-m’en San Simion,
    acercam-se-m’ondas,
    grandes que son.
    Ondas m’emparedan,
    eu sin rum’ ô guia.
    Ondas s’m’engolfam,
    e eu cerrad’ a dia.
    Madre, qu’ondas altas
    contra mim vêm.
    Madre, qu’ m’envoltan,
    e eu prà ’qui sin pé.
    -
    Estrelinha num longe céu,
    frágil barquinha no forte mar,
    fruste borboleta p’la vastidão adejando,
    assim eras tu,
    por esse nosso mundo, meu amor.
    -
    Sonhe meu fim descansado
    num canto terra florido,
    seja o meu corpo chagado
    num continuado olvido,
    ache-se sempre a meu lado
    da plenitude o sentido,
    noutro momento moldado
    o poema seja vivo,
    pra redizer acabado
    meu disperso derivar.

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